Três dias após a Mesa Diretora da Câmara Municipal de Curitiba decidir, por unanimidade, encaminhar representação formal ao Conselho de Ética da Casa contra a vereadora Maria Leticia (PV), houve a instauração de um processo disciplinar contra a parlamentar – ré na Justiça por embriaguez ao volante e desacato.

Em coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira (22), o presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar (CEDP) da Câmara de Curitiba, vereador Dalton Borba (PDT), afirmou que os nove membros do conselho deverão eleger entre si, na quarta (24), quem será o relator e o vice-relator do processo administrativo. De acordo com a instituição, os dois eleitos serão responsáveis por conduzir as investigações em torno do acidente de trânsito que levou a vereadora a ser presa em flagrante.

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O vereador e presidente do Conselho de Ética da Câmara de Curitiba, Dalton Borba (PDT), durante coletiva de imprensa – Foto: Djalma Malaquias/22.jan.2024/Banda B

Após a escolha do relator e vice-relator, o primeiro irá ler a representação da Mesa Diretora e abrirá um prazo para a defesa prévia da vereadora. Em seguida, se inicia a fase de instrução – em que serão apresentadas as provas e ouvidas as testemunhas do caso, por exemplo – para a formação do juízo de convicção.

“Existem duas leis tratando do prazo. Há uma lei federal, que fala em 90 dias corridos, e uma local, que estabelece 90 dias úteis. Para evitar qualquer tipo de nulidade, temos aqui o compromisso de fazer com que o trâmite se encerre em 90 dias corridos”, disse Dalton Borba em relação ao prazo do trâmite do processo.

Após a fase de instrução, diz o presidente do conselho, haverá a etapa de alegações finais, que pode contar com a participação do corregedor da Câmara, o vereador Ezequias Barros (PMB). Em relatório apresentado no último dia 15, antes de o Conselho de Ética determinar a abertura de um processo administrativo contra Maria Letícia, Ezequias Barros descartou a possibilidade de pedir a cassação da vereadora. Ele avaliou que Maria Leticia deveria ser punida com penas leves.

A representação formalizada pela Mesa Diretora pede que o Conselho de Ética avalie três condutas atribuídas à Maria Leticia no boletim de ocorrência registrado pelos policiais militares que atenderam o acidente de trânsito:

  • ⚖️ Indícios de que a vereadora estava embriagada;
  • ⚖️ Indícios de que ela tentou fugir do local do acidente e;
  • ⚖️ Possível desacato aos policiais.

A Mesa Diretora também solicitou que três policiais militares que atenderam a ocorrência sejam ouvidos, além da passageira de Maria Leticia na noite do ocorrido. Após a etapa da admissibilidade, em que a vereadora apresenta sua defesa prévia, ela poderá elencar quais testemunhas de defesa deverão ser ouvidas.

Segundo Borba, ainda é cedo para afirmar se o Conselho de Ética irá decidir pelo envio do relatório final ao plenário e, consequentemente, abrir a possibilidade de cassação do mandato da parlamentar. “Até agora não houve instrução processual adequada. Todas as possibilidades estão em aberto. Ela [Maria Leticia] pode sofrer quaisquer penas previstas no Código de Ética. Isso vai depender da apuração que será feita, que pode até terminar com o arquivamento [do processo disciplinar]. Não podemos fazer juízo nenhum de valor antecipadamente… Até porque não sabemos ainda quais são as provas e os fundamentos que darão lastro à investigação”, prosseguiu Borba.

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A vereadora Maria Letícia (PV) na Câmara Municipal de Curitiba – Foto: Rodrigo Fonseca/CMC

Ao término da etapa de alegações finais, será produzido um relatório final pelo Conselho Ética, cujos membros irão deliberar se o encaminharão para o plenário da Câmara ou se o processo será arquivado.

“O Conselho de Ética, a partir de agora, tem absoluta autonomia para apuração dos fatos e aplicação do dispositivo legal adequado, que chamamos de juízo de subsunção. Não há uma vinculação ao que foi apresentado pela Mesa Diretora da Câmara. É possível que haja um novo enquadramento e, como disse e reitero, que o conselho entenda que pode ser o caso de arquivamento”, concluiu o presidente do conselho.

Veja quais são os vereadores que compõe o Conselho de Ética

  • Dalton Borba (PDT)
  • Angelo Vanhoni (PT)
  • Eder Borges (PP)
  • Jornalista Márcio Barros (PSD)
  • Marcos Vieira (PDT)
  • Pastor Marciano Alves (Solidariedade)
  • Professor Euler (MDB)
  • Rodrigo Reis (União)
  • Zezinho Sabará (União)

O caso

Maria Leticia foi detida após se envolver em um acidente de trânsito na Alameda Augusto Stellfeld, na região central de Curitiba, em novembro. De acordo com o boletim de ocorrência ao qual a Banda B teve acesso, era por volta das 20h quando a parlamentar bateu o carro que dirigia contra um automóvel estacionado. Ela estava com uma assessora no veículo.

Após a batida, a PM foi acionada, e ela foi presa por suspeita de embriaguez ao volante e desacato. No registro da ocorrência, consta que a vereadora “tentou funcionar o veículo para se evadir [fugir] do local, mas foi contida pela equipe policial, que desligou o veículo”.

Maria Leticia também teria se recusado a entregar as chaves do seu carro, respondido que não as entregaria porque é vereadora e dito que os policiais iriam “se ferrar”. Uma testemunha relatou ainda que ela tentou fugir antes da chegada dos policiais.

Os agentes que atenderam à ocorrência apontaram para a “intensa agressividade” e “inquietação da vereadora”, que teria dado chutes e socos no interior da viatura. Algemada, passou a se debater no “camburão” da viatura. Em seguida, os policiais ofereceram o teste de bafômetro à Maria, mas ela recusou.

Já na delegacia, admitiu a um policial civil que havia ingerido bebida alcoólica, segundo o boletim de ocorrência: “Foi ouvido a senhora Maria Leticia falar para sua advogada que ‘nem tinha bebido tanto assim’”. Além disso, um copo plástico que estava no suporte da porta do carro da vereadora foi apreendido.

Em vídeo publicado nas redes sociais dois dias após a prisão, a vereadora afirmou estar em “tratamento quimioterápico” e fazer uso de fortes medicamentos, que podem causar “sonolência, amnésia, dificuldade na fala e confusão mental”.

A denúncia

O Ministério Público do Paraná (MP-PR) denunciou a vereadora Maria Leticia por suspeita de embriaguez ao volante e desacato em dezembro do ano passado. Cerca de três semanas depois, a Justiça aceitou a denúncia oferecida pela Promotoria e tornou a parlamentar ré.

O órgão, contudo, ofereceu benefício de suspensão condicional do processo. A medida é aplicada em casos em que as penas são igual ou inferior a um ano. Para ser beneficiada, a vereadora terá de cumprir algumas determinações do juiz.

Na denúncia, o MP considerou que Maria Leticia, “ao ser abordada, agindo com vontade livre e ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, com a intenção de ofender e menosprezar a função pública, desacatou os policiais militares que faziam o atendimento da ocorrência”. A parlamentar teria afirmado que os policiais “iriam se ferrar” por ela ocupar um cargo na Câmara Municipal de Curitiba.

A Promotoria também argumenta que a vereadora se recusou a fazer o teste de bafômetro, após serem “constatados visíveis sinais de embriaguez”, além de apresentar olhos vermelhos, desordem nas vestes, hálito alcoólico, atitude agressiva, arrogante, exaltada, irônica, falante e dispersa, dificuldade no equilíbrio e fala alterada.