Era o dia 24 de abril de 2023 quando foi divulgado oficialmente o balanço do Paraná Clube. No texto assinado pelos auditores independentes da Müller & Prei, um título dizia o seguinte: “Incerteza relevante sobre a continuidade operacional”. O risco residia na situação financeira precária do Tricolor. E segundo a auditoria, seria necessária “a equalização da situação patrimonial e financeira, inclusive sua recuperação judicial”. Exatos 129 dias depois deste documento, os paranistas puderam comemorar a aprovação da RJ, passo fundamental para a refundação do clube.

Foi no final do dia 31, última quinta-feira, que a juíza Mariana Gusso, da 1ª Vara de Falências de Curitiba, realizou o despacho que concedia a RJ ao Paraná Clube. Divulgado no sistema do judiciário paranaense às 9h08 da sexta (1), a aprovação fechou um processo de 430 dias, com idas e vindas, momentos de incerteza e de confiança, mas que terminou da forma que o clube esperava. A partir de agora, a consolidação da SAF passa a ser uma realidade. E a Banda B conta os bastidores desta jornada.

O início: “dano irreparável” ao Paraná Clube

Em 28 de junho do ano passado, o Diário Eletrônico do Tribunal Regional Federal da 4ª Região publicou o edital do leilão da sede da Kennedy. Uma dívida do Paraná Clube com o Banco Central, no valor de R$ 35.405.390,23, levou a Justiça a tomar tal decisão. Vindo de um dramático rebaixamento para a segunda divisão do Campeonato Paranaense, com invasão de campo e punição pesada do TJD, o Tricolor sofria mais um duríssimo golpe. Era preciso agir.

Um grupo de advogados, empresários e políticos, que se reunira em um grupo de WhatsApp, já vinha ajudando o Paraná Clube na montagem do plano de recuperação judicial. Com o leilão marcado para 13 de julho, foi necessário acelerar o processo. Um dia depois do edital do TRF4, o Tricolor entrava na Justiça com o pedido de recuperação judicial. O documento citava o leilão, informando que se acontecesse haveria um “dano irreparável” ao clube. A juíza Mariana Gusso autorizou o início do processo da RJ e o leilão foi cancelado.

O plano: esperança na SAF

O plano de recuperação judicial do Paraná Clube protocolado na 1ª Vara de Falências aponta várias causas para a situação financeira. Dos impactos da pandemia de Covid-19 até os maus resultados em campo, os advogados paranistas traçam um panorama dos últimos anos tricolores. “Os resultados em campo espelharam o fluxo financeiro, e tornaram-se frequentes as greves, o atraso de salários e o acúmulo de dívida“.

O pedido de urgência tinha explicação, segundo os advogados. “O Paraná Clube sofre bloqueios diários em suas contas em razão das execuções, o que prejudica o pagamento de fornecedores, de folhas de salários e demais despesas essenciais para a manutenção de suas atividades”. A RJ tricolor tinha como objetivo abrir o caminho para a SAF, que “trará consigo a vinda de um
investidor, que injetará dinheiro nos cofres do clube”.

As idas: avanço no processo

Em setembro de 2022, o Paraná Clube e a CBAJ, que tocava o processo de recuperação judicial, entregaram à Justiça um levantamento completo sobre a situação do clube. Foram listados os credores, apresentadas a viabilidade econômica e os ativos financeiros e o laudo de avaliação dos imóveis. Como curiosidade, este laudo foi assinado por Nivaldo Carneiro, engenheiro e ex-jogador do Athletico. Nesta papelada, um ponto fundamental: a sede da Kennedy era apresentada como uma possível garantia para o acordo da SAF.

A CBAJ enviou no final daquele setembro uma avaliação das condições do Paraná Clube cumprir a RJ. Segundo a administradora, foi “possível apurar que o Paraná Clube, ora Recuperanda, está em plena atividade e mantendo seus postos de trabalho, com o cumprimento regular de suas obrigações como folha de salários, recolhimentos de impostos correntes e adimplemento de fornecedores e prestadores de serviços terceirizados”.

As vindas: credores e pressões

O final de 2022 foi de movimentos burocráticos dentro do processo. Publicação de editais, o tempo para que interessados apresentassem objeções, outro tempo para que os credores se apresentassem. Tudo dentro dos conformes, até que foi marcada a primeira Assembleia Geral de Credores. Anunciada em fevereiro, ela aconteceu em 12 de abril. Estavam presentes 120 dos até então 428 credores.

Não foi um encontro tranquilo. Houve questionamentos sobre o deságio (o valor da redução das dívidas), sobre prazos de pagamento e sobre a criação ou não de um comitê de credores. Tentando desatar as questões da sede da Kennedy, o Paraná Clube pediu o adiamento da assembleia por 90 dias. Mas os representantes da Justiça sugeriram o adiamento por 60 dias, até 12 de junho. Em um cenário de incerteza, os credores aprovaram a transferência.

Avanço: aprovações e negociações

Em 12 de junho, nova assembleia. Dias antes, o Paraná Clube havia protocolado um novo plano de recuperação judicial, alterando o deságio – atendendo a um pedido dos credores e a argumentações informais do Ministério Público do Trabalho. Foi colocada no novo texto também a possibilidade da venda da sede da Kennedy para pagar dívidas. Apesar de uma forte manifestação do Fluminense, o plano foi aprovado por ampla maioria.

O processo voltava à juíza Mariana Gusso. Em julho, um despacho da magistrada pedia a manifestação do MP sobre a RJ. E também pedia ao Paraná Clube certidões negativas de débito, alegando que era necessária uma manifestação clara do Tricolor que cumpriria com suas obrigações. A dívida de R$ 123 milhões com 453 credores seria reduzida para pouco mais de R$ 60 mi. E começou a movimentação paranista para obter as certidões.

O desfecho: as últimas emoções

Com quatro empresas interessadas em comprar a SAF, o Paraná Clube partiu para a estratégia decisiva. Com o apoio de vereadores, foi pedido o levantamento completo das dívidas do clube com a Prefeitura de Curitiba. Ao mesmo tempo, buscava atender a outra ordem da Justiça: a indicação de outros bens que substituíssem a sede da Kennedy no caso de não autorização da alienação do imóvel.

Na semana passada, o Ministério Público se manifestou: aprovava a RJ do Paraná Clube, mas reforçava a necessidade da apresentação das certidões de débitos. Os últimos documentos foram entregues: foram indicados terrenos em Guaratuba e a Vila Olímpica do Boqueirão como possíveis substitutos da sede da Kennedy. Então chegou a hora do veredito. E a juíza Mariana Gusso concedeu a recuperação judicial. E agora começa uma nova história do Tricolor, uma refundação.

Paraná Clube - bandeira
Foto: Allexandre Felipe/PR

Comunicar erro

Comunique a redação sobre erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página.

Paraná Clube: os bastidores da recuperação judicial

OBS: o título e link da página são enviados diretamente para a nossa equipe.