O horário de verão, que voltou ao radar do governo Lula como medida para tentar evitar o racionamento de energia, traz alívio para o sistema elétrico, mas pode ter pouco impacto para o bolso dos consumidores, segundo especialistas e associações do setor consultados pela reportagem.
Extinto em 2019, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), a retomada do programa seria uma alternativa para enfrentar a seca extrema no país.
“O horário de verão não interfere no valor da conta de energia, ou no valor da tarifa. A conta ficará mais barata somente se o consumidor economizar no uso de equipamentos elétricos. A economia no consumo de energia com o horário de verão é residual. O principal objetivo é a preservação do sistema elétrico, que é bastante exigido no horário de pico de consumo (ou de demanda de energia)”, afirma, em nota, Alexei Vivan, diretor presidente da ABCE (Associação Brasileira das Companhias de Energia Elétrica) e presidente do SindiEnergia (Sindicato das Indústrias de Energia do Estado de São Paulo).
Vivan diz que, com o aumento das fontes de geração de energia eólica e solar, que costumam ter redução ao final do dia, a medida também passa a fazer mais sentido.
Segundo Fernando Teixeirense, diretor de relações institucionais e comunicação da Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres), o programa serve para amenizar o horário de pico, quando muita gente volta do trabalho e está usando chuveiro, ar-condicionado, entre outros utensílios domésticos. “O horário foi criado para dar um respiro ao sistema no horário de pico do consumo”, disse.
Marco Delgado, ex-diretor de regulação da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), diz que, como a carga de consumo fica mais pesada das 18h às 21h e os reservatórios das hidrelétricas estão em níveis muito baixos, a retomada poderá trazer efeitos ambientais e tarifários favoráveis, com a tendência de redução no uso de termelétricas, que são mais caras para a geração de energia e mais poluentes.
O presidente da Frente dos Consumidores de Energia e ex-diretor geral do ONS, Luiz Eduardo Barata, considera que o governo deve ter cautela ao tomar a decisão de retomar o programa, mas que ele pode auxiliar na tarifa. “Acredito que o horário de verão tem um impacto bom na conta de luz, são necessários estudos mais recentes para poder indicar isso formalmente, mas era algo que as pessoas estavam acostumadas a conviver e, na situação que nós estamos vivendo hoje, poderia auxiliar nos valores da conta. Eu era, inclusive, um dos defensores do horário de verão, que acabou deixando de funcionar em 2019.”
Já na opinião de Nivaldo Castro, professor da UFRJ, a questão acaba por desviar de problemas mais graves que o setor enfrenta: crise hídrica, subsídios e perda do protagonismo do governo em relação à política energética para o Congresso.
Estudo realizado pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) em 2021 concluiu que a retomada do horário de verão não teria impacto no enfrentamento da crise energética brasileira naquele momento, pois o programa não era uma garantia de economia de energia.
Delgado explica que, durante a pandemia, o horário de pico passou a se concentrar mais em períodos da tarde, o que também reduziu a efetividade do horário de verão à época.
Priscila Arruda, pesquisadora do programa de Energia do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), destaca que, nos últimos anos, o padrão de consumo de energia no país cresceu devido ao aumento no uso de ar-condicionado.
“Segundo o Ministério de Minas e Energia, o pico de consumo, que antes se concentrava no período noturno, passou a ocorrer também nas manhãs e tardes. Apesar disso, análises do ministério realizadas com dados de 2018 e 2019 indicaram que o horário de verão aliviou a demanda de energia no final do dia. Com essa nova dinâmica, o impacto do horário de verão vinha diminuindo, e a tendência histórica indicava que ele eventualmente deixaria de ser relevante” disse.
Com a grave seca e o uso de térmicas, a conta de luz de setembro está com a bandeira vermelha patamar 1, que gera cobrança de R$ 4,463 para cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos, o que pressiona a inflação do país.