O governo federal estuda maneiras de permitir a aviação de cabotagem no Brasil e assim estimular a concorrência no setor de transporte aéreo, hoje dominado por três companhias.
A aviação de cabotagem acontece quando uma aeronave de uma companhia estrangeira que faz voos para o Brasil é autorizada a estender a permanência do avião no país com a realização de uma perna doméstica.
O Ministério de Portos e Aeroportos confirmou que o tema “é importante e está em discussão na Secretaria Nacional de Aviação Civil”, mas afirmou que não se manifestaria sobre o assunto.
A medida permitiria um aumento na oferta de voos, na visão de quem participa das discussões.
A Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas) disse que não comenta assuntos em debate inicial.
Hoje, a lei exige que após a realização de uma linha aérea dos Estados Unidos para Manaus, por exemplo, a aeronave precisa deixar o Brasil. Com a alteração em estudo, a aeronave poderia realizar um voo para Belém (PA).
A ideia inicial, que tem o aval do Ministério de Portos e Aeroportos, é fazer testes de mercado por um período determinado em algumas cidades, como o Rio de Janeiro (Galeão) e na região Norte.
Os dois locais são apontados como bons para testes por razões diferentes. Na região Norte, as distâncias entre as cidades são maiores, o que possibilitaria uma maior oferta de voos.
Já para o Galeão a medida é vista como uma forma de revitalizar o aeroporto, que fica na principal cidade turística do Brasil.
O aeroporto internacional carioca sofre com uma queda no número de passageiros embarcados, que se agravou depois da pandemia de Covid-19. Entre 2014 e 2022 esse indicador caiu 66%, o que representa 5,6 milhões de passageiros.
O problema levou a diversos movimentos. Primeiro, a RIOGaleão, concessionária do aeroporto, pediu no início do ano passado a devolução da concessão, que foi obtida no fim de 2013. O tema ainda está em discussão no TCU (Tribunal de Contas da União).
Depois, já neste ano, o governo federal decidiu limitar os voos do outro aeroporto carioca, o Santos Dumont, para trajetos de até 400 km. A ideia é que o Galeão absorva os voos para destinos mais distantes.
Para que a aviação de cabotagem seja possível no Brasil é necessária uma alteração legal no Código Brasileiro de Aeronáutica, principalmente no artigo 216 da lei. O dispositivo estabelece que “os serviços aéreos de transporte doméstico são reservados a pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no país”.
Para que empresas estrangeiras entrem no mercado a partir da aviação de cabotagem, esse artigo precisa ser alterado.
A ideia do governo é que a mudança seja feita a partir de um projeto de lei apresentado por algum parlamentar, mas ainda não há definição de quem e quando isso acontecerá.
A discussão não é nova no Brasil e chegou a ser tratada na Câmara em 2016, na Comissão de Turismo, mas sem avançar; também foi objeto de um estudo do Senado Federal.
Além da mudança legal, outro caminho apontado nessa nota técnica é o de acordos multilaterais, seguindo o exemplo do que fez a União Europeia com seus países membros.
A mudança no bloco europeu, aponta o estudo do Senado, “permitiu a expansão de companhias de baixo custo […] com saldo positivo para o consumidor, uma vez que aumentou a oferta de assentos e as demais empresas aéreas foram obrigadas a baixar suas tarifas para enfrentar a concorrência”.
A cabotagem é permitida também entre empresas aéreas da Austrália e da Nova Zelândia.
Um caminho para isso no Brasil seria ampliar o Acordo de Fortaleza, do qual participam Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai. Nesse caso, a abertura viria para as companhias aéreas desses países.
No Brasil, a maior parte do mercado de transporte aéreo no Brasil é dividido entre três empresas: Azul, Gol e Latam. Entre março de 2020 e fevereiro de 2021 a Gol tinha 37,8% do mercado, a Latam 31,4% e a Azul 30,3%.