A Americanas, varejista em recuperação judicial com dívidas declaradas de R$ 42,5 bilhões, adiou pela quarta vez a divulgação das demonstrações financeiras de 2022 e da revisão do balanço de 2021.
As demonstrações financeiras deveriam ser publicadas na manhã desta segunda-feira (13). Até a noite de domingo (12), a assessoria de imprensa da companhia havia confirmado a apresentação.
Mas a varejista enviou no início da madrugada desta segunda um fato relevante à CVM (Comissão de Valores Mobiliários), informando o novo adiamento, agora para quinta-feira (16).
De acordo com o texto, a empresa foi “vítima de uma fraude sofisticada e muito bem arquitetada, o que tornou a compilação e análise de suas demonstrações financeiras históricas uma tarefa extremamente desafiadora e complexa.”
A Americanas diz que o trabalho de elaboração das demonstrações financeiras de 2021 e 2022 já foi finalizado e que os procedimentos de auditoria dos dois balanços foram “substancialmente concluídos”. No entanto, “ainda não foi possível cumprir todo o rito interno de aprovação previsto na governança da ‘companhia”. A auditoria da empresa está a cargo da BDO.
No dia 16, segundo a varejista, a divulgação também ocorrerá antes da abertura de mercado. Assim como estava previsto para hoje, na quinta, a Americanas pretende realizar uma teleconferência para investidores e mercado em geral para apresentar os resultados e informar sobre o andamento do seu plano de recuperação judicial. Planeja ainda informar sobre o plano estratégico da companhia.
Devem participar do evento o presidente da Americanas, Leonardo Coelho, e a diretora financeira e de relações com investidores, Camille Loyo Faria.
A Americanas adiou por quatro vezes a publicação do balanço do ano passado -previsto originalmente para o final de março, passou para maio, depois para o fim de outubro, para 13 de novembro e agora para o dia 16.
Na quarta-feira (8), a B3 suspendeu a Americanas do Novo Mercado, onde estão, teoricamente, as empresas com o mais alto nível de governança corporativa. A companhia afirmou que vai apresentar recurso.
FRAUDE FOI BATIZADA DE ‘INCONSISTÊNCIAS CONTÁBEIS’
Na noite de 11 de janeiro deste ano, a Americanas divulgou um fato relevante ao mercado informando sobre “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, o que levou à renúncia do então CEO Sergio Rial e do principal executivo de finanças, André Covre, ambos recém-empossados.
Em 19 de janeiro, a empresa entrou em recuperação judicial, com dívidas declaradas de R$ 42,5 bilhões. Os maiores bancos do Brasil são os principais credores da varejista, e foi com eles que a empresa deu início a uma verdadeira batalha nos tribunais: as instituições financeiras não aceitavam receber calote da companhia, até então uma das maiores do setor de varejo do país, que tinha livre acesso a crédito.
Em junho, a empresa assumiu fraude nos balanços. Relatório elaborado por assessores jurídicos que acompanham a Americanas desde que ela entrou em recuperação judicial apontou que demonstrações financeiras da varejista vinham sendo fraudadas pela diretoria anterior da empresa, o que inflou seus resultados em R$ 25,3 bilhões -esse foi o lucro fictício acumulado ao longo dos últimos anos (a companhia não informou ainda quantos anos).
A antiga diretoria da Americanas atravessou décadas na empresa. À exceção do ex-CEO Miguel Gutierrez, que se aposentou ao final de 2022 para passar o bastão a Rial, os demais diretores foram afastados semanas depois de o escândalo vir à tona.
A atuação dos três principais acionistas da varejista -o trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, sócios da empresa de private equity 3G Capital- também esteve sob escrutínio.
Conselheiro da companhia, Sicupira foi apontado como o representante do trio diretamente ligado ao dia a dia da Americanas. Mas, em depoimento à CVM (Comissão de Valores Mobiliários), disse que ficou ‘em choque’ ao receber ligação de Rial para tratar do escândalo contábil.
No final de setembro, a CPI (comissão parlamentar de inquérito) que investigava a Americanas encerrou suas atividades sem apontar culpados.
ACORDO COM OS BANCOS, MAIORES CREDORES, ESTÁ EM NEGOCIAÇÃO
Depois de intensas brigas judiciais, um acordo com os bancos está em fase final de aprovação, para dar andamento ao plano de recuperação judicial. O trio de bilionários deve injetar R$ 12 bilhões na Americanas, incluindo todas as parcelas do financiamento DIP, de R$ 2 bilhões, desembolsadas à época da capitalização, em fevereiro. Do inglês debtor-in-possesion financing, ou “financiamento do devedor em posse”, o financiamento DIP é usado apenas em recuperações judiciais.
Com isso, segundo comunicado divulgado pela Americanas no final de outubro, a expectativa é que a assembleia geral de credores para a aprovação do plano de recuperação judicial da companhia seja realizada ainda este ano.
Já os resultados de 2023, acumulados até o terceiro trimestre, devem ser apresentados em 29 de dezembro.
As operações da empresa ao longo de 2023 sofreram forte impacto. Nos primeiros sete meses da crise, mais de 9.000 funcionários foram demitidos. De acordo com o mais recente relatório de acompanhamento mensal dos administradores judiciais da empresa, em 5 de novembro, o grupo tinha 33.342 colaboradores. Na metade de janeiro, a Americanas somava 43.123 funcionários.
Entre 19 de janeiro, quando teve início a sua recuperação judicial, e 5 de novembro, a Americanas fechou 121 lojas -o que significa encerrar as operações de um ponto de venda a cada 2,5 dias, em média.
Hoje, a varejista soma 1.759 lojas. Em janeiro, eram 1.880.
A base de clientes da companhia recuou 12,4% entre janeiro e setembro, para 42,3 milhões.
Segundo relatório de acompanhamento mensal dos administradores judiciais enviado à CVM no início de outubro, a Americanas tem 16 ações de despejo em andamento por falta de pagamento.