É praticamente impossível passar pela Praça Generoso Marques, no Centro de Curitiba, sem notar a imponência do Paço da Liberdade. A construção, que foi a primeira sede fixa da prefeitura da capital paranaense, hoje abriga um espaço cultural. A revitalização do prédio a partir de 2006, inclusive, transformou essa região da cidade, que era evitada por moradores e desconhecida pelos turistas.
O edifício foi idealizado pelo então prefeito Cândido de Abreu, em 1912, com a demolição do Mercado Central da cidade. A obra iniciou somente em 1914 e foi inaugurada dois anos depois, permanecendo como sede do Executivo municipal por mais de 50 anos, até 1969.
“A importância da edificação do Paço não se dá apenas por ter sido a sede da prefeitura, ele tem uma importância histórica pela rua, que é a rua da liberdade, que vinha da estação do trem, que é hoje é o Shopping Estação e ia até onde hoje é o Shopping Müeller, que na época era praticamente a cidade industrial de Curitiba. Ele tem uma localização e uma importância pela sua função na época”, citou Tatiana Zanelatto, arquiteta e especialista em conservação e restauro de monumentos históricos.
O local ainda abrigou o Museu Paranaense de 1974 a 2002, ficando abandonado depois disso.
“Nesse período que ficou fechado, com a saída do Museu Paranaense, começaram a ter invasões, furtos de tubulações e peças de cobre, fogo no assoalho porque as pessoas de rua moravam lá e faziam fogo com madeira do próprio museu. Até que o Sistema Fecomércio foi procurado pelo poder público para uma parceria e criar uma unidade cultural”, explicou Emerson Sextos, diretor Regional do SESC PR.
Em 07 de julho de 2006, a história do Paço da Liberdade passou a ser reescrita com a assinatura do Decreto de Permissão de Uso concedido ao Sistema Fecomércio Sesc Senac PR, por 25 anos. A partir disso, o prédio foi todo restaurado e transformado em um centro cultural, aberto ao público em 2009.
“Alguns anos atrás foi feita essa intervenção de restauro muito criteriosa. A arquitetura dessa construção é fantástica em art-nouveau. A gente vê pela própria fachada, pelos vitrais, por aquelas curvas e aqueles Adônis segurando os pilares. É uma obra realmente muito especial para a cidade de Curitiba. Temos poucas edificações com o nível de detalhamento do Paço. Quando foi construído lá atrás foi pensando que, como uma capital, ele precisava ter uma edificação com uma valorização, com um nível de detalhamento e riqueza muito grande”, destacou Tatiana Zanelatto.
História preservada
Além de recuperar a arquitetura do século passado, as escavações no prédio revelaram o piso do antigo Mercado Municipal de Curitiba – característica que foi preservada pelo Sistema Fecomércio. No andar térreo, por exemplo, é possível visualizar esse pedaço da história.
“No restauro nós conseguimos preservar alguns espaços do prédio. Em alguns cômodos há um vidro onde embaixo está o antigo piso do mercado municipal, que depois veio a ser nossa prefeitura. A pessoa que visita o nosso espaço se enriquece da história da cidade”, detalhou diretor Regional do SESC PR.
Emerson Sextos garantiu que a imersão na história paranaense está em cada canto do Paço.
“Esse prédio, além da arquitetura, tem todo o contexto histórico. O prefeito da época, Cândido de Abreu, idealizou ele voltado para onde conseguisse ver o crescimento da cidade. Então, essa história enriquece esse prédio. Nós temos uma sala preservada de onde Cândido de Abreu despachava, incluindo a mesa e o telefone da época”, disse à Banda B.
A importância do local é tamanha que ele é o único prédio curitibano tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
“Em 1948, o serviço do Patrimônio Histórico de Curitiba decretou o tombamento do Paço Municipal e o reconhecimento a nível federal, pelo IPHAN foi obtido em 1984. O Paço é o único prédio de Curitiba que é tombado nas três instâncias: municipal, estadual e federal”, lembrou o historiador Felippy Strapasson, em entrevista à Banda B.
A transformação do comércio local
A revitalização do Paço da Liberdade também mudou a realidade do comércio local. Cercado por lojas que funcionam em casarões seculares e em frente ao Mercado das Flores, que reúne floristas tradicionais da cidade, o prédio se tornou ponto turístico indispensável no roteiro dos visitantes, o que gerou mais movimento nos estabelecimentos comerciais.
Rosa Baron trabalha há anos com a venda de flores na loja vizinha ao Paço e contou que foi nítida a mudança positiva promovida com a criação do centro cultural.
“Ele é muito bonito mesmo. Depois que revitalizaram ficou mais bonito ainda, mais bem frequentado também. Vem muita gente encantada com o espaço. Eu trabalho na venda de flores e sou vizinha do Paço há anos, com muito orgulho”, comemorou.
O comerciante Everaldo Pereira dos Santos disse que, depois da reforma, viu o movimento triplicar.
“Depois de revitalizado, ele ficou bem melhor. Eu percebi que depois disso, aumentou o fluxo de turistas e isso é bom pro nosso trabalho, porque sempre tem gente querendo apreciar o Paço”, garantiu.
E não precisa permanecer muito tempo em frente ao Paço para perceber os olhos encantados com o cenário perfeito para a foto. Maria Fernandes Oliveira Santos é professora aposentada e esteve pela primeira vez na capital. Desde que pensou no roteiro, tinha certeza de que queria visitar o prédio. “Ele é lindo. Com a escultura toda trabalhada, me chamou muito a atenção”, revelou.
E para atender pessoas como a Maria é que o Sistema Fecomércio, em parceria com a prefeitura e o Sebrae, apostou na qualificação dos comerciantes.
“Com a parceria do SESC, prefeitura e Sebrae, também fizemos um trabalho no entorno do Paço com a revitalização e cursos de empreendedorismo para os comerciantes locais sobre a melhor maneira para trazer de volta as pessoas para o comércio. Além de levar cultura, o Sistema Fecomércio transformou a região central da cidade”, pontuou Emerson Sextos, diretor Regional do SESC PR.
Aberto ao público
A visitação no SESC Paço da Liberdade é aberta ao público de terça-feira a domingo, das 10h às 22h. Boa parte da programação é gratuita.
“Ali nós temos apresentações, exposições, peças de teatro em tamanho reduzido e recitais. É um ambiente totalmente cultural aberto aos curitibanos e turistas. Também há um café do Senac, que é o nosso irmão, onde as pessoas se reúnem para tomar um café gostoso, fechar negócios ou ter um momento de lazer”, ressaltou Sextos.
Para a arquiteta Tatiana Zanelatto, com eventos gratuitos ou de baixo custo, o Paço torna o acesso à cultura mais democrático.
“Hoje a manutenção dele traz não só a perpetuação da história, mas ele tem uma relevância ímpar porque o SESC Paço da Liberdade promove uma série de atividades que promovem essa valorização da memória e do patrimônio. Aonde a comunidade se identifica, se sente proprietária desta história. E a educação patrimonial é primordial para que a população se sinta pertencente disso”, considerou.
Segundo o historiador Felippy Strapasson, a abertura do Paço para a comunidade reforça a importância do edifício para a história da cidade.
“Eu acredito que o Paço como patrimônio cultural constitui-se como palco da história da cidade, da memória coletiva dos habitantes. É possível através dele ter contato com a arte, com a literatura, com a poesia. O Paço é, com certeza, um dos mais importantes edifícios do Paraná”, finalizou.