“Pra mim, o feminismo tem a ver com o poder da fala e o poder da transformação que essa fala te causa”. É assim que podemos definir uma das fortes opiniões de Vanessa da Mata. Completando 20 anos da gravação do primeiro disco neste ano, a cantora se apresentou em Curitiba no sábado (30) e fez um balanço da carreira até aqui.

O show foi no Teatro Sesi Campus da Indústria. A apresentação, com valores reduzidos pela iniciativa do Sesi, teve ingressos esgotados.
Além dos 20 anos de primeiro disco, Vanessa, que começou sua trajetória num grupo feminino de reggae, chamado Shalla-Ball, também completa 30 anos de carreira musical. Em entrevista à Banda B, a cantora avaliou que, quando olha para trás, gosta muito do que eu fez até agora.
“Não posei nua, nunca usei meu corpinho. Faço música que eu gosto muito e me sinto orgulhosa como mulher. Usei minha inteligência o máximo que pude. Meu jeito de fazer música é para a música”.
Vanessa reforçou não ter problemas com artistas que expõem o próprio corpo, mas disse que não se sentiria à vontade se o fizesse.
“Todo mundo faz o que quiser, usa o sexual, o corpo, tá ótimo. Eu não me sentiria tão bem, não me orgulharia tanto. Acho que, pra mim, o feminismo tem a ver com o poder da fala e o poder da transformação que essa fala te causa”, explicou.

Espaço feminino
Vista como uma das principais compositoras da música atual, Vanessa da Mata disse ainda sentir falta de outras mulheres compondo. Segundo ela, que já no primeiro disco trouxe um material quase que completamente autoral, ainda resta um espaço a ser preenchido.
“É uma questão de poder falar, está totalmente ligado a isso. As mulheres antes, na época de Rita Lee, por exemplo, que é uma fundamental compositora, precisou ir a fundo em tudo, desregrar tudo e ter essa libertação. Era taxativo: mulher não fala e quem compunha eram os homens para as mulheres”.
Vanessa lembrou de um episódio que viveu quando escreveu um livro. A história, chamada A Filha das Flores, foi passada para críticos de literatura antes do lançamento, e a opinião a surpreendeu.
“Entregaram para dez pessoas, críticos de literatura. Acharam que o livro era de um homem, que não era iniciante e que já tinha lançado vários livros. Mas era eu”.
Veja a entrevista completa:
Novo disco
O novo disco de Vanessa da Mata, intitulado Quando Deixamos Nossos Beijos na Esquina, foi lançado em 2019, pouco antes da pandemia. A cantora disse que, em sua análise, o disco fala sobre matar a solidão, de se encontrar, se refazer, se realimentar. E veio num momento importante para todos nós.
“Quando a gente está num momento em que opinião atinge o outro como se fosse ofensa pessoal a ele, a gente tem atrito o tempo todo. Estamos mais acostumados a ver brigas, discussão, horror, do que amor, beijos, abraços e palavras de carinho e afeto. Esse disco é todo interligado e fala dessa libertação”.
Muito ativa nas redes sociais e também na vida “offline” como um todo, Vanessa da Mata disse que a geração atual ainda não entendeu a importância de valorizar as pessoas como elas são.
“Essa geração está acostumada a padronizar frutos, gente e tudo”.
Segundo a cantora, quando as pessoas percebem uma diferença, querem o tempo todo tachar, podar e desfazer aquela pessoa.
“Seja ela homoafetiva, gorda, alta ou cabeluda como eu. Isso é muito pobre, é muito burro, você percebe que essa pessoa internamente se castra e tenta castrar o outro o tempo todo, não consegue conviver com o mundo e com uma relação de tolerância geral e com ela mesma”.
